Fato
verídico, o que narro logo nas primeiras páginas de meu livro, CONFISSÕES DE UM
ADVOGADO.
Minha primeira audiência
foi um tanto, digamos, singular. Nunca
entrara em uma sala de audiências.
Era
ainda solicitador acadêmico. Prestava serviços no escritório de um dos mais
dignos advogados que conheci, Professor Rubem Cione. Uma
manhã ele me disse: “Venha de paletó e gravata à tarde. Você vai acompanhar-me
em uma audiência.” Naquele
tempo Ribeirão Preto tinha apenas três varas. Lá fomos nós. A primeira vara,
onde seria a audiência, ficava no primeiro andar. “Vá
para a sala de audiência e espere-me lá.” Falou-me. Foi
o quê fiz. Entrei,
a sala estava vazia, pois era a nossa a primeira audiência. Fiquei sentado
aguardando. Decorrido
alguns minutos entrou uma pessoa, o qual imaginei ser o escrivão. Mandou que
sentasse ao seu lado na mesa. Sentei. Ele indagou-me: --Seu
nome? Respondi.
Ele datilografou. --Data
de nascimento? Respondi.
Ele datilografou. --Número
da identidade? Respondi.
Ele datilografou. Ele
continuou a datilografar e, tendo terminado, ficamos ali por alguns instantes
em silêncio. Logo
entrou uma pessoa absolutamente circunspecta que, sentando-se à cabeceira da
mesa, em posição mais elevada, tomou nas mãos um processo e leu-o em silêncio
rapidamente. Em
seguida dirigiu-se a mim: --O
senhor sabe por que está sendo processado? Fiquei
entre um misto de curioso e muito assustado, pois eu não sabia que estava sendo
processado. Respondi:
“Não sei não senhor”. Ele
abaixou a cabeça, franziu o cenho e, sisudo, olhou para o escrivão, que também
estava surpreso indagando-me: --No
dia 20 de Novembro de 1964, o senhor não brigou com seu cunhado na Vila Tibério,
por volta das... Comecei
a gaguejar alguma coisa quando, neste momento, Professor Rubem Cione -que se
atrasara- adentrou à sala e desfez todo o equívoco. O
que se dera é que o escrivão, desejando adiantar o termo de audiência, vendo-me
na sala, qualificou-me. O Juiz, tomando dos autos, não tendo acompanhado a
qualificação, começara a audiência. Não
me lembro mais quem era o Juiz –parece-me que Dr. Dalton da Silveira Vita- mas
lembro-me bem que ele desculpou-se comigo. Naquele tempo os juízes ainda
desculpavam-se. Hoje, -é uma pena!-, apenas alguns ainda desculpam-se. No
fim todos nós estávamos rindo à pregas soltas. J.
R. M. Garcia.