CESNA 170
Não me recordo porque assim foi.
Mas
o certo é que lá de Pontes e Lacerda, Mato Grosso, procurarem-me com um enorme
problema de uma empresa que se dedicava a colheita de grãos, estocagem e distribuição.
Sua dívida ficou imensa. Vários bancos, empresas privadas, tratores
financiados, caminhões transcendiam em muito seu patrimônio.
A
viagem era longa. Saia de São Paulo, descia acho que em Uberlândia e pousávamos
em Cuiabá. No dia seguinte tomava um monotor fretado e, voando sobre a Serra
das Araras, chegávamos, após uma hora e meia de voo, em Pontes e Lacerda. Pista
de terra. O avião era um cesna 170.
SERRA DAS ARARAS
Lindo voar sobre a serra em um dia claro.
Vendo seus contornos nítidos, em voo baixo, apreciando exatamente as cabeceiras
do Pantanal onde fácil era deduzir-se que ali fora uma baia onde o mar
adentrara há milênios passados. Disseram-me que no alto das serranias, ainda se
encontra conchas marinhas. Nitidamente, nas escarpas destas serras a gente vê,
cá do alto, que o mar não desocupou rapidamente o local, mas foi um processo
lento do afastar das águas firmando-se falésias agora secas por longos
períodos. Desta serra nasce o Pantanal.
E
lá fomos nós.
PONTES E LACERDA
Uma hora e trinta de voo surge a cidade
de Pontes e Lacerda.
Aterrizamos.
Esperavam-me.
E
foi aquela confusão por mais de semanas. Discussão com bancos, credores
particulares, arrendamentos descumpridos e uma dívida imensa para a época.
Impossível qualquer medida judicial.
Como
a Bolívia ficava próximo pela chamada “estrada do pó” (leia-se estrada da
cocaína), aconselhei meus clientes a pegarem seus caminhões, que não eram
poucos, carretas, carregá-los todos e em comitiva irem para a Bolívia, enquanto
eu fazia ali uma espécie de “muro de arrimo judicial”, até que eles passassem a
fronteira para o outro lado.
E
assim, com grande dificuldade em um embarque adrede preparado, eles “vazaram”,
como se diz no linguajar chulo da fuga dentro da noite escura pela “estrada do
pó”. E nunca mais soube do destino deles.
Morreram
? Tornaram-se traficantes ? Conseguiram vida nova na Bolívia ?
Nunca
mais vi falar deles.
Terminado
o “muro de arrimo jurídico” tomei outro avião fretado e voltei.
Agora
tudo foi diferente.
PAULISTINHA
O piloto era de garimpo e de tráfico de
tóxicos. Não tinha brevê. O avião era outro. Era um “paulistinha” velho de lona
encerada.
Vi
aquilo com medo e perguntei.
--A que altitude este avião vai ?
O
piloto, com cara de ressaca, entre uma baforada e outra respondeu:
--Uns mil e quinhentos metros.
--Mas então passaremos raspando o topo da
serra ?
--É. Mas a gente conhece alguns caminhos
no meio delas que não precisa ir tão alto.
Mas...Tremendo
o aviãozinho e eu, erguemo-nos.
E
fomos direto para a serra. Dentro de poucos minutos estávamos subindo para
pulá-la.
Uma
névoa espessa, densa encobriu-nos toda visão.
De
repente eu dou grito horrível e completo minha explicação, a qual ele já vira.
No
meio da incrível cerração, haviam picos mais altos que o nosso aviãozinho.
Teríamos de contorná-los. Mas naquela situação era impossível. Ele perdera a
“estrada” de que falara.
--Vamos voltar....Ele completou.
Mas
eu pensava: “Voltar como, no meio daqueles picos que não víamos ?”
Por
fim, em um segundo clareou e abriu o horizonte. Estávamos voltando. O piloto
sabia trabalhar em condições adversas com aquele teco-teco.
--Vamos descer aqui e esperar esta
neblina ir embora.
Dei
graças a Deus. Aterramos em um frigorifico próximo a uma cidadezinha.
Desci,
peguei minha mala, pedi desculpas ao rapaz e disse que ia arrumar uma condução
qualquer lá.
CORISCO