quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

LOUVADO SEJAM OS CEGOS

JULGAMENTO DE SÓCRATES

       Quando me refiro aos cegos, não estou a enaltecer os que não enxergam. Estes não. Eles, possivelmente, veem muito mais que nós.
    Sócrates, filósofo da antiga Grécia, julgado pelo Tribunal dos 500, defendeu-se explicitando que nada mais fazia em sua pregação aos jovens, senão aclarar o que estava escrito sobre os pórticos do Templo de Delfos: “Conheça-te a ti mesmo.”
      São estes, os que a si ignoram-se não se vendo, que me refiro aqui como cegos.
       Por quê digo isso ?
     Porquê a maioria de nós não se vê. Imaginamos que tudo inicia no Shopping, no cinema, no motel e tudo ali também termina.
        Mas, por quê “louvado sejam os cegos”?

ZUMBI

     Porquê estes, condenando Sócrates a morte, são felizes da vida, contentes, lépidos, folgados, tranquilos, serenos. Nada veem, nada sentem. Não se vendo não podem enchergar seus semelhantes e passam por este mundo como zumbis desencarnados. São de um egoísmo telúrico, se posso expressar-me assim. 
DIVÃ  ANALISTA
        Já o que se veem, sofrem. A proposta de Sócrates é uma autocrítica e autoanálise pesada e franca. Ao nos vermos, somos obrigados a uma investigação sistemática de nós mesmo. É como se arrastássemos sobre nós um foco de luz e começássemos a escanear nossa alma, fazendo uma espécie de autopsia viva de nosso espírito.
HIPOPÓTAMO
   Assim, creio que seja muito mais feliz os “cegos”, comportando-se com o couro grosso de um hipopótamo, nada sentindo que não lhe ultrapasse a pele terrivelmente resistente.          Já o infeliz que vê, que sente, de delicados sentires, sofre em si e por si o que lhe vai a volta, tal qual a gaivota que, das alturas, vê toda vastidão da terra.  
        Deste modo, louvado sejam os cegos.
        Uma ótima quinta feira.
        J. R. M. Garcia.