segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

UM SONHO PROFUNDO DEMAIS - CRÔNICAS E CONTOS - GARCIA




Dormi.
Quando acordei estava em um deserto imenso. Somente areia por todos os lados a perder de vista. Tão estranho era este deserto, que nem sombra de mim mesmo existia.
Um pouco à frente uma moça com vestes brancas olhava o areal.
Estranho aquilo tudo.
Por quê estava ali?
               Estava consciente, sóbrio, mas nada sentia seja do vento, do calor. Nada.
Se aproximava da moça à frente, ela se afastava também.
Logo, eu estava absolutamente só.
Morto eu não estava, pois a moça estava ali.  
Ocorreu-me estas perguntas.

“Isto é solidão, estar consigo mesmo?
Solidão só quando o si mesmo é um deserto?
Devo fazer do deserto um  jardim?
Devo povoar um país deserto?
Devo abrir o jardim encantado do deserto?”
Carl Jung.

Pensei:     
Ah ! Entendi...”
              Estava na companhia de minha alma.Tenho tido, de algum tempo para cá, a impressão de que poucos de nós temos a oportunidade e sobre tudo a coragem e, talvez, mais: a loucura de estarmos com nossa própria alma.
              E, à medida que avanço no pouquinho que consigo, assusto-me.


Tenho às vezes a amarga ciência de que, ao adiantar tenho de recuar, uma vez que parece tal qual um vasilhame, onde a utilidade está exatamente no espaço vazio em seu interior.
Talvez a alma seja útil porque ela é exatamente isso, um vácuo também. É, possivelmente, na areia do deserto onde a vida é gravada em letras cuja cor somente Deus saiba.
Mas não estou certo disso.
Enfim, acordei do sonho. Não estava morto, ainda.  
 
Tenham uma ótima semana!
 
J. R. M. Garcia.