terça-feira, 22 de abril de 2014

= MEU TIO AVÔ =


   Aliás, este foi o único irmão de minha avó que conheci. E, mesmo assim, em dois encontros casuais.
      Uma pessoa curiosa, quando nada.
    Ele gostava de dar tiros. Tinha mania de nominar seus objetos pessoais, trazendo  antropomorfismo as coisas. Seu revolver, por exemplo, chamava-se “nagão” e ele o portava sempre. Este revolver tornou-se mítico.
      Nunca casou, nunca constituiu família, sempre teve muitas namoradas. Viajou, para a época, grandes distâncias. Era briguento e, às vezes, extremamente humilde. Para se ter uma idéia era, de quanto em vez, nomeado oficial de justiça “ad oc” para diligências difíceis, em locais remotos de grandes comarcas. A aquela época o oficial de justiça era confundido com a parte e o cumprimento das diligências era na base do tiro mesmo. Logo, muitas vezes, desempenhava estas desagradáveis e estranhas funções.
      Mas enfim nem sempre ele estivera do lado formal da lei. Pois consta que por vários dias trocou tiros de dentro de uma igreja, que ainda existe, com a polícia por alguns dias. Resistia a um mandato de prisão.   
      Tinha uma letra linda, bordada. Fazia poesias. Havia uma caderneta onde as teve guardadas, mas não me recordo da qualidade delas.
    Era extremamente curioso, de humor fácil.  Ainda vivo, quando a Rússia lançou o primeiro satélite artificial, indagou-me o tamanho do mesmo. Informei-o da dimensão do pequeno artefato. Ele dobrou de rir, achando um estardalhaço que a mídia fazia à semelhante peçazinha de nada útil. Tentei explicar-lhe detalhes, mas já não me dava atenção.
      Viajou ao Rio a cavalo para conhecer a capital federal, em uma comitiva de “cometas”. Assim, esteve sumido meses da localidade longínqua e pequena onde morava. Voltando ficou meses proferindo “conferências” sobre o que por lá vira.
      Morreu só, lúcido, pleno de suas faculdades, em provecta idade, supostamente dormindo, vindo a ser o óbito constatado dois dias depois.
      Estas são as lembranças que tenho de Pacífico Garcia.
      Tenham uma abençoada semana.
      Abraços.
      J. R. M. Garcia.