sexta-feira, 30 de outubro de 2015

CRÔNICA E CONTOS (Borges e Garcia)

ELE ESTAVA SEM CELULAR


A temporada já estava no fim. Após o carnaval e todos já iam embora. As praias, aos poucos, esvaziavam.
Ele, sentado ali fora na varanda, aproveitava a brisa ainda fresca da manhã.
--Antônio. Traga-me o de sempre.
O garçom foi e trouxe a vodca pura com limão. Ele fazia questão de espremer as fatias.
Bebeu um gole curto e ficou a olhar o movimento daqueles que se preparavam para viajar.
Passou mais de hora e ele pediu outra vodca.
Mais uma hora.
E nada.
Ele pensou: “Estranho! Ela disse que viria aqui antes de viajar...”
Distraia-se com os carros que iam pegar estrada. Uns com bicicletas sobre o teto. Outros terrivelmente cheios. Alguns com crianças e pais nervosos tentando alojá-los dentro. Um porta bagagem que não fechava de modo algum. Esquecidos voltavam correndo ao prédio, para um último objeto. Era aquele clima de voltar para casa e pegar no batente.
Ora ele imaginava-se vendo-se ir pescar com os novos amigos, jogando a rede ao mar para ao amanhecer ir busca-la. O movimento seria menor e seria mais tranquilo. Ora pensava nela. Afinal foram dez dias de troca de ideias, de murmúrios, de conversas sobre o que iam descobrindo um do outro. Tudo novidade. O novo é sempre uma esperança.  Era como se aos poucos fossem descobrindo cada reentrância do corpo e da alma. Fora ótimo. Haviam se despedido na noite anterior, depois de uma volta na praia e ela somente com um vestido longo sem nada sob ele. Hoje esperava dizer-lhe como se encontrariam novamente.
De repente a mulher surgiu afobada.
--Antônio, ele apareceu aqui?
Ela perguntou ansiosa.
--Sim, madame. Ficou até agora mesmo.
Com um gesto de raiva ela pediu.
--O mesmo que ele tomou....mas em dobro.
De bermudas ele não usava o celular.
J.  R. M. Garcia.