CRÔNICAS E CONTOS (Borges e Garcia)
="BUDAR"=
Não é fácil.
Um exemplo simples.
Uma criança está a volta da
mãe, em um pequeno apartamento, “molestando-a” na confecção de um jantar. De
repente a criança vira uma travessa sobre uma área da cozinha. A mãe se irrita
e dá-lhe um tapa. Ela chora sem compreender o que houve exatamente. A mãe
irrita-se e, em tom de ânimo e voz alterada, põe-se a limpar a área que a
criança sujou.
É comum acontecer isso.
A compreensão, que deveria de
ir além, levando esta mãe a pensar que o apartamento é pequeno e que a criança
não dispões de espaço para brincar, vê-se atarantada e desfecha o tapa
aparentemente injusto no entendimento da criança. Quando na verdade, espaço é
que é o problema. Por transferência de ambos, o clima de beligerância ou de
ânimo está estabelecido. E isso pode durar poucos minutos, horas ou o dia todo.
E isso, repetidas vezes,
terminará por estabelecer alguma espécie ruim de comportamento na criança, na
mãe e na família.
Creio que, quanto mais o nível de consciência de uma
criatura atingir níveis mais elevados, esta dificuldade aumenta.
Complica, digamos assim.
Enquanto uma pessoa simples
atribui a culpabilidade sobre seus semelhantes, isso torna mais fácil para si
própria a absorção, a análise e os gravames que ela carrega sobre si mesmo, os
equívocos que vão enrijecendo dentro de si.
Com uma consciência mais ampla
sobre os fatos, seus entendimentos, suas apreciações, seus julgamentos
interiores, sua autocrítica, as analogias aumentam a complexidade no
estabelecimento de um critério que fica mais próximo da realidade e alivia a
todos. Ao contrário, isso, esparge, sobre um certo
sentido, a faz sofrer a todos. Logo o pai chega e já pega um clima ruim sem
nada entender. Filho nervoso, mulher nervosa e ele cansado.
O fenômeno da transferência
para terceiros é o mais comum. Sempre nosso próximo tem a culpa e nós mesmo
vítimas.
No fim, o que resulta, é que enquanto deveriam
conversar do fato em si, mas já agora esquecidos do que aconteceu, vão ver a TV
irritados, mudos, em uma atitude que digo para minha mulher “budar”
(emburrada). -rs-
A falta do diálogo e uma
compreensão mais vasta, inteligente, arrasa uma vida. Do nada começa uma grande
desgraceira de pessoas abespinhadas, prontas a beligerância.
J. R. M. Garcia.
<martinsegarcia@uol.com.br>