sábado, 19 de dezembro de 2015

CRÔNICAS E CONTOS (Borges e Garcia) = LADRÕES LEGALIZADOS =

CRÔNICAS E CONTOS (Borges e Garcia)

LADRÕES LEGALIZADOS


Coloque-se na condição de dois jovens de dezesseis anos, de classe média baixa e experimente sentir o que eles sentem. Com fidelidade não vai conseguir, mas com um pouco de imaginação poderá, pelo menos, supor.
Eles sentirão uma invasão de hormônios a encher-lhes o sangue. Suas glândulas, até ontem dormentes, submergem seus corpos em ondas sucessivas buscando aproximá-los. Ela de um rapaz e ele de uma moça. Ambos sentem o que antes não sentiam com tanta frequência. Mas, agora, é vívido seu interesse pelo sexo oposto. E eles querem fazer tudo certo. Querem namorar, passear, andarem juntos, ir a festas e, enfim, casarem.
Mas as limitações são muitas e, quanto ao futuro, recusam-se até mesmo a pensar.
Olham para um mundo cheios de ofertas, de bens a consumir e sabem que o mínimo necessário se faz necessário para se estabelecerem uma casa, um lar. Mas como conseguir?
Agonizam-se. Não há meios. Uma terra sem emprego, onde as manchetes de jornal são povoadas de políticos ladrões, o assassinato em média beira a 56.000 ao ano. A cada 15 minutos um menor é preso, o emprego é difícil e, quando existe, ganha-se pouco demais. Mas ele e ela se amam. Essa é a verdade.
Como enfrentar isso. Não tem emprego nem para pagar o aluguel.
E os hormônios a replicarem, cada vez mais insistente, no casal.
Em verdade amam-se.
Essa á a situação usual da classe média brasileira.
Disso advém a ansiedade, a angústia e a loucura. Querem o que seus hormônios exigem. Querem o mais simples. O que fizeram seus pais no passado. Namorarem, casarem, terem um lar e viverem.
Mas isso lhes é proibido. Se tentarem esta imitação estarão fracassados ou destruídos.
Logo, para aplacar suas vontades imperiosas surge a ansiedade, a angústia, a vício e a loucura. Ou, ao contrário,  cometem a transgressão de todas as normas, tornando-se ladrões não legalizados. Digo não legalizados, porquê os legalizados estão no Congresso, no Judiciário e no Governo e nem sequer imaginam este problema que aqui abordo.
Logo, pelos fatos, quem são os culpados?
Somos nós que colocamos mais de 200 milhões de pessoas a viver em um país pobre, maldito, sem condições, ou eles que são as vítimas por terem nascido?
A caridade aqui cabe como um gesto humano de compreensão.
Não são marginais. Foram sim feitos marginais.
Um ótimo domingo.
J. R. M. Garcia.
<martinsegarcia@uol.com.br>