sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

CRÔNICAS E CONTOS (Borges e Garcia) = " PUTA QUE PARIU...."=

CRÔNICAS E CONTOS (Borges e Garcia) 

"PUTA QUE  PARIU.........."


Na roça   - como chamávamos antigamente - não tinha TV, radinho de pilha às vezes com muito ciúme do dono. Nenhum telefone.  Com chuva, havia muitas goteiras. Telhas comuns. Dormia-se cedo, pois não tendo luz elétrica, todo pessoal reunia na cozinha em volta do fogão de lenha. E o papo rolava solto. Eram mentiras e verdades de todo jeito.
Esta era uma noite destas. Sem lua, com jeito de chuva e todo mundo em volta do fogão de “rabo longo”, como diziam.
Assunto vai e assunto vem, cada um com o seu, vem lá um dizendo uma estória que não posso confirmar, mas quem contou disse que procedeu da maneira que o fez como  a única maneira possível. E citou testemunhas conhecidas.
Alguns de vocês conhecem carrapatos. Outros não. Vou explicar. O carrapato, que se alimenta do sangue, enfia um ferrão pequeno na pele e lá fica fincado até que vem a coceira. Ele crescendo até que o farmacêutico ou médico dá um jeito de arrancá-lo. Mas tem que arrancar com o ferrão. Se o ferrão permanecer, é infecção braba na certeza. Se for arrancado logo no início, com o ferrão, não dá infecção.
Andando nos cerrados é muito comum os carrapatos. As vezes até mais de uma dezena.
Apresentado o inseto, vamos ao caso.
Segundo o narrador, o patrão havia andado muito no meio do cerrado e, dois dias depois, estava queixando de uma coceira terrível no pênis. Coçava e não passava.
O empregado disse:
---Deixo ver?
Olhou e não viu nada. Mas a coceira ficou muito pior. Parecia sarna, mas não era.
---Vomo oiá de novo?
---Não. Num tem nada não.
---Não é pussíve. Tá coçano demais.
E ele olhou de novo. Desta vez com o prepúcio puxado deixando ver a glande exposta.
Pronto.
Estava lá o carrapato debaixo do prepúcio, firme na glande.
---Nossa patrão. Vicheeee............é um grandão na cabeça do pinto, debaixo da pele.
A vítima falou:
---Como? Como está droga está aí em um lugar tão protegido.   
        Ele, meio assustado, respondeu:
---Chefe...o único modi que sei de tirá isso é cum fogo. Se num tirá ele vai entrar pele adentro. Mas nun lugá desse....
        O cara deu um grito:
---Comooooooo !!!!!!!!!!!!!!!! Quer por fogo em meu pinto? Cê tá louco, amigo?
---He! Mode mais uma noite que passa, aí vai entrá na pele do cê e lá vai coloca ovos.
        O cara ficou sem saber.
---Mas você quer passar uma palha de fogo em meu pinto. É isso?
        Ele explicou.
---Você assegura a capa do pinto e arregaça (prepúcio)  Eu, com um cigarro de palha, vou esquentano o danado até ele caí. Aí cai com ferrão e tudo.
---Não. Isso eu não vou aguentar. A pele da glande é muito fina e vai aquecer e não vou aguentá.
        Ele respondeu de pronto.
----Bamo numa famárcia, mais num vai diantá nada. Este farmaceutiquinho aqui nem sabe que o bicho tem ferrão venenoso e vai dar fecção.
Já agora suando, preocupadíssimo, isolados em uma choça sem ter ninguém para perguntar, o patrão coçava e andava de lá para cá sem sossego, e preocupado. Aproximava uma chuva também.
----Você vai ascender seu cigarro de palha, ir aproximando do carrapato até que ele, desesperado de calor, retire o ferrão e caia. É assim?
----É.
----Nossa Senhora! E você, nessa tremedeira, com a luz da lamparina vai tremer mais. E pode me queimar a glande. E daí nem tira o carrapato, e eu fico com uma queimadura?
----Bão....Mas pegá no seu pau pra segurar ele. Eu num vô fazê isso não. Ocê sigura.
       Claro. Era mais que viável as negativas dele. E nem o patrão queria isso.
Ficaram em silêncio por algum tempo.
----Vamos ver. Pegue a lamparina com chama mais alta.
 Ele veio, olhou, olhou e o patrão revirou o membro de todas as formas, como se estivesse em uma exposição. Puxando o prepúcio, o  “médico” examinou tudo.
Levantou a lamparina e olhando bem em olhos da vítima, disse:
----O bicho é grande. Coisa medonha esse carrapato. Nunca vi isso!
----Mas o jeito é enfrentar a peroba, né ?
Ele respondeu respeitoso.
----É.
Com calma fez um cigarro de palha bem cheio de tabaco, grosso, ascendeu, amassou a ponta que agora já estava aceso, soprou a brasa e foi aproximando.
Vixxxxxxxxxxxxxiiiiiiiiiiii !!!!!!!!!!!!!!!!!!
Segundo ele conta, o homem contorcia de dor.
Uma tortura.
O empregado “médico” soprava a brasa, avivava o cigarro de palha e aproximava novamente.
Cada vez mais perto.
E, no fim, o dono do pinto gritou.
----Páreeeeeeee.............................Áiiiiiiiiiiiiiiiii!!!!!!!!!!!!! Vá a puta que te pariuuuuuuuuuuuuuuuuuu............Porra! Saco!
Banhado em suor disse:
----Não aguento mais. Tem que parar.
O empregado gritou energicamente.
----Nãoooooooo!!!!!!!!!!!!!! Agora é que não. O bicho tá caindo. Tá contorcendo. Aguenta aí........... (Isso as gritos).
Nessas alturas o cidadão vítima, já esta banhado em suor, deitado, de pernas abertas e o peão parecia um parteiro sem parto. O pinto escapou varias vezes, e o cigarro de palha queimou o prepúcio.
Aí, em um urro tremendo, a vítima gritou:
----Vai de uma vez filhe da puta................
E o peão quase encostou a brasa no pinto para aumentar o calor da brasa. Até os cachorros latiram fora da casa assustados e sem entender aquela gritaria.
Pronto.
----Úfa! Que castigo!
O cara saiu mijando pelas pernas.
E como estava queimado, não podia passar as mãos.
Deitou de novo (agora já estava deitado) passou álcool, o que doeu demais também. Mas nada perto das lentas queimaduras.
No outro dia nem entumecido estava o local.
O peão era mestre.
Cada um, após esta longa estória, verdadeira ou não, foram embora um a um para dormi.
Desmanchou a roda, como se diz.
Ninguém disse nada, senão um boa noite.
J. R. M. Garcia.
<martinseegarcia@uol.com.br>