CRÔNICAS E CONTOS (Borges e Garcia)
Causo verídico
samurai
Faz muito tempo.
Tudo é muito antigo em mim.
Fui contratado para o quê devia de ser uma concordata
em Araguari. E, para lá fui. Tudo indicava que seria mesmo concordata (hoje chamam de recuperação
judicial).
A dívida maior era com a firma de um japonês em São
Paulo. Eles vendiam, naquele tempo, insumos para agricultura. Quanto aos bancos
controlamos a situação.
Havia ainda mercadoria encalhada na empresa procedente
da fornecedora de adubos.
Pedi para ver uma saca lacrada. Olhei. Vi uma fórmula
muito bem descrita, especificando o que deveria conter no dito ingrediente.
A firma credora ameaçando protestar os títulos, como
de fato protestou.
Peguei uma saca lacrada do dito adubo e fui para Campinas,
para o CATI (Coordenadoria Técnica de Assistência Integral).
Pediram-me uma semana ou mais para analisar o
material. Era tempo demais. E os protesto do japonês caiam. E sofrendo e
esperando. O cliente cada vez mais angustiado.
Telefonava dia sim, dia não no CATI.
Uns 20 dias depois, eles disseram: “O resultado de seu
material está aqui.”
Pronto.
O que dizia que estava na fórmula e não condizia em
nada com o material. Faltava tudo.
Fui para São Paulo, sede da empresa fraudulenta.
Dei-lhes a fotocópia, (nesta época já existia), do
laudo do CATI, instituição das mais famosas no Brasil.
Sumiram dois dias. No terceiro apareceram no hotel
simples onde hospedava em São Paulo.
Queriam acordo.
Não concordei. Pedi para devolver o resto da
mercadoria e o perdão integral da dívida.
Berraram. Espernearam. Tentaram tudo.
Eu firme.
No fim concordaram, mas surgiu outro problema. Topo
com um pseudo-samurai.
E aqui entra a filosofia dos japoneses, tão antigas
como antes de Cristo.
Eles me trariam a composição de acordo sem eu ver o
dono da empresa assinar. Isso não aceitei. Ou eu via ele assinando ou, nem com
firma reconhecida, não servia. Eles são irredutíveis nesta coisa de costumes. Mas
eu não podia confiar.
E esse impasse ficou por mais três dias.
No fim fui até a empresa, sem portar o laudo, sem
assinar o documento de acordo, mas com ele na pasta. O filho, que no princípio
me tratava bem, sua vontade agora era matar-me, pois disse que ia desmoralizar
o Samurai com uma chantagem. Era interessante! Eles ladrões e eu “chantagista”.
Mas não os chamei de ladrões. Apenas fiquei firme.
Vi o velho, o Samurai assinar. Ele não olhou para mim e
saiu em um minuto sem cumprimentar-me.
Ganhei a concordata.
Fato real.
Boa Quarta Feira.
J. R. M. Garcia
<martinsegarcia@uol.com.br>