NOITE PARA NÃO PESCAR
A noite está fria. Uma leve brisa sopra
em direção à praia. Uma lua linda no céu carrega em luminosidade difusa o cenário.
Mas ali não é exatamente o mar. É a foz
do rio Pando. Não é largo nem estreito. É um rio previsível, que vindo do
interior vai dar ao Atlântico.
Ele está sentado ali sob a luz
mortiça de uma ponte. Pulando de pedras em pedras chego até onde está.
--Beliscando?
Ele responde que sim.
--A noite fria não afugenta os peixes?
--Não. O vento sim e não está ventando.
Fico em silêncio e ele me pergunta.
--Do Brasil?
--Sim. Falo menos que um dialeto. Qualquer coisa que
me entendam.
Ele sorri e eu também.
--Mas entendo bem o espanhol se falam lentamente.
Volta a sorrir.
--E eu falo lento?
--Sim.
Novamente o silêncio. Fico olhando as
ondas passarem na corredeira. Ele também. Sua atenção parece estar longe ou,
talvez, próxima.
Sento em uma pedra.
--Pesca há muitos anos aqui?
--Algum tempo. Fui prático. Saía com navios do
porto...Você entende, não é? Mas agora fiquei aleijado. Não trabalho mais.
Nada perguntei. Talvez não gostasse de
falar no assunto.
De repente um forte puxão e ele
realmente fisgou alguma coisa grande. Ele escorregou e caiu na água. Vi que não
tinha uma perna.
Afundou e não voltou mais.
O rio, embora de águas mansas, levou-o
de vez.
Olhei, olhei e fui embora também.
No outro dia procurei e não vi nada no
jornal.
Ali constava uma notinha de fundo
dizendo que seu corpo não fora encontrado.
Boa Páscoa.
J. R. M. Garcia.