sábado, 15 de abril de 2017

"UMA NOITE PARA NÃO PESCAR" (CRÔNICAS E CONTOS) -Garcia-

 NOITE PARA NÃO PESCAR
 
 
A noite está fria. Uma leve brisa sopra em direção  à praia. Uma lua linda no céu carrega em luminosidade difusa o cenário.
Mas ali não é exatamente o mar. É a foz do rio Pando. Não é largo nem estreito. É um rio previsível, que vindo do interior vai dar ao Atlântico.
Ele está sentado ali sob a luz mortiça de uma ponte. Pulando de pedras em pedras chego até onde está.
--Beliscando?
Ele responde que sim.
--A noite fria não afugenta os peixes?
--Não. O vento sim e não está ventando.
Fico em silêncio e ele me pergunta.
--Do Brasil?
--Sim. Falo menos que um dialeto. Qualquer coisa que me entendam.
Ele sorri e eu também.
--Mas entendo bem o espanhol se falam lentamente.
Volta a sorrir.
--E eu falo lento?
--Sim.
Novamente o silêncio. Fico olhando as ondas passarem na corredeira. Ele também. Sua atenção parece estar longe ou, talvez, próxima.
Sento em uma pedra.
--Pesca há muitos anos aqui?
--Algum tempo. Fui prático. Saía com navios do porto...Você entende, não é? Mas agora fiquei aleijado. Não trabalho mais.
Nada perguntei. Talvez não gostasse de falar no assunto.
De repente um forte puxão e ele realmente fisgou alguma coisa grande. Ele escorregou e caiu na água. Vi que não tinha uma perna.
Afundou e não voltou mais.
O rio, embora de águas mansas, levou-o de vez.
Olhei, olhei e fui embora também.
No outro dia procurei e não vi nada no jornal.
Ali constava uma notinha de fundo dizendo que seu corpo não fora encontrado.
Boa Páscoa.
J. R. M. Garcia.