AVIÃO TIPO CORISCO
Em atenção aos leitores e ao eficiente
gerente do “resort” onde habito, Sr. ΝΙΚΟΛΑΟΣ ΧΑΡΙΛΑΟΣ ΚΑΣΦΙΚΗΣ, um grego, vou terminar o fato verídico que narrei antes: O retorno da viagem a Pontes e Lacerda. Afinal, todo grego é curioso, vocês sabiam ?
Vamos lá.
Embarcamos a bordo do pequeno
“corisco” e, em uma pista estreita e curta, alçamos voo em direção contrária ao
vento. O piloto e o gerente do frigorifico à frente, eu atrás. Logo voltamos e
tomamos o rumo da Serra das Araras.
Chegado a um determinado
ponto adrede definido pelo piloto, começamos a fazer voltas. (o GPS ainda não
existia). Subíamos sempre. Umas quatro voltas se bem me lembro. Em espiral
ascendente.
SOBRE AS NUVENS
Por fim, suponho que cerca de
1.500 mts. de altura, vimos sobre a serra uma cortina de nuvens densas e o
horizonte azul, livre a perder de vista. Subíramos acima da serração.
Aí entendi o estratégia do
piloto.
Ele subira, fora da serra,
até a altura que, vendo em baixo a cortina de nuvens, ia pular a serra em cerca
de meia hora mais ou menos e, do outro lado desceria também sem nada que lhe
opusesse a visão.
Medida inteligente: pular as
nuvens, a neblina, a serra e, do outro lado, descer.
Voamos aproximadamente uns
trinta minutos.
O piloto começou a inverter a
posição da quilha, a medida que fizera antes ao subir. Fazendo uma espiral
descendente começamos a ir ao rumo em que ele, pelos instrumentos, supunha que
estava a pista.
Pronto.
CABINE DO PILOTO EM VOO CEGO
Aí a coisa embaraçou e
embaçou.
Mergulhamos novamente em uma
neblina tão densa como a que fugíramos dentro da serra. Não se via nada.
A orientação era o altímetro
e orar para que, de fato, tivéssemos “pulado” a serra e nenhum morro nos
esperasse do outro lado dela para nos matar.
VISÃO DE UMA ATERRAGEM
Creiam-me: o tempo não se
mede pelas horas e nem pelos dias. Mede-se sim pela intensidade de nossas
emoções. Os instantes haviam congelado. Nada falávamos. Só o ronco estridente e
acelerado do motor e o flaps de arrasto segurando.
O avião descendo, descendo,
buscando o solo em um voo com poucos graus de inclinação na quilha. Digamos que
tateávamos as nuvens como a mão de um cego passa sobre uma mesa em busca de
algum objeto. Mas o objeto aqui, se fosse uma antena alta ou um serro, ou
torres de energia elétrica, era morte certa. Mesmo acelerado o “corisco” não
teria tempo. Seria o fim.
Transpirávamos. O dia era
quente. Gotas de suor escorriam pelas faces do piloto, eu vi. Nada falávamos.
Enfim, por Deus, vimos em um
buraco entre a névoa em que enxergamos o chão. Como um rato o piloto embicou
ali o avião antes que fechasse. Foi rápido, muito rápido. Estávamos abaixo das
nuvens a uns duzentos metros do chão.
E voamos assim em linha reta
rumo ao aeroporto, que não era o de Cuiabá, como eu esperava. Descemos em um
campo de pouso de grama a uns 30 km. de Cuiabá. Porquê isso não perguntei e não
sei.
Enfim, pousamos. Descemos
rápido como se estivéssemos saindo de uma câmara de tortura. O gerente do
frigorífico, que deixara de fumar, voltou a fumar pedindo-me um cigarro.
Fui com eles para Cuiabá.
Neste dia não voei mais,
embora pudesse. Estava esgotado.
O que ganhei com isso ?
Quase nada. Uns poucos níquéis Meus clientes fugiram para a Bolívia, que estava perto dali.
Até mais.
J. R. M. Garcia.