CRÔNICAS E CONTOS (Borges e Garcia)
LILI
Quem
foi Lili ?
Não sei muito da vida deste atleta
de pequena cidade.
Sei em parte o que me contaram,
pois já o encontrei velho atrás do balcão de uma coletoria, (hoje exatoria
estadual).
Ainda se denotava nele o
extraordinário atleta que fora na Associação Esportiva Ituiutabana, denominada
“Veira” nos antigos tempos em que existiu. Era um ponta esquerda veloz, incriticável.
Tendo “Paredinha” na defesa, eles eram imbatíveis.
Lili era feliz. Se preparava para
as grandes partidas em um campo meio torto para a direita, um pouco de terra e
outra tanto gramado. Corria, era veloz.
Fotografias dele como atleta
talvez a família ainda tenha, mas nada de radialistas, jornais ou coisas assim.
A imprensa era somente escrita em um jornalzinho local sem fotos. Ele ia a pé
ou correndo para o campo pelas ruas.
Passavam horas conversando dos
muitos desafios que no passado houveram e, juntos, levavam a minguada plateia
ao delírio.
“El tiempo no perdona”, lembra o
poeta e, ao afinal, de grandes atletas, o time desmanchou-se. Todos eles
envelheceram, mas “Paredinha” na defesa e ele no ataque, sempre foram inesquecíveis lembranças.
Uma tarde o já velho Lili agarrou
um colchão de casal cheio de capim membeca e foi atravessar a rua. Sumiu
debaixo da incômoda pesada carga.
Não atravessou. O colchão pesava
perto de 150 quilogramas e ele de baixo, ainda na fé de sua juventude, foi até
o meio da rua e ali perdeu as forças, até que ajoelhou-se e desabou com a carga
sobre o calçamento da rua debaixo do imenso colchão.
Ficou quietinho. Não se moveu. Nem
gritou. Sua última visão deve ter sido do calçamento onde caiu. Mas lá, muito
longe, ainda ficaram suas lembranças.
Não sei se esta é uma história
nostálgica ou não, pois afinal quase todas criaturas falecem sobre um colchão e
com ele deu-se o inverso. Faleceu sob um colchão. Quem morre no trabalho, lá na
minha terra, eles diziam que era um “rola pedra” e ele foi uma destas criatura.
Quem sabe ainda joga no céu
aqueles passes rápidos e os dribles infindos? Era assim que ele desejava a
eternidade.
J. R. M. Garcia