terça-feira, 2 de agosto de 2016

CRÔNICAS E CONTOS (Borges e Garcia) - LILI--

CRÔNICAS E CONTOS (Borges e Garcia)



LILI

         Quem foi Lili ?
Não sei muito da vida deste atleta de pequena cidade.
Sei em parte o que me contaram, pois já o encontrei velho atrás do balcão de uma coletoria, (hoje exatoria estadual).
Ainda se denotava nele o extraordinário atleta que fora na Associação Esportiva Ituiutabana, denominada “Veira” nos antigos tempos em que existiu. Era um ponta esquerda veloz, incriticável. Tendo “Paredinha” na defesa, eles eram imbatíveis.
Lili era feliz. Se preparava para as grandes partidas em um campo meio torto para a direita, um pouco de terra e outra tanto gramado. Corria, era veloz.
Fotografias dele como atleta talvez a família ainda tenha, mas nada de radialistas, jornais ou coisas assim. A imprensa era somente escrita em um jornalzinho local sem fotos. Ele ia a pé ou correndo para o campo pelas ruas.
Passavam horas conversando dos muitos desafios que no passado houveram e, juntos, levavam a minguada plateia ao delírio.
“El tiempo no perdona”, lembra o poeta e, ao afinal, de grandes atletas, o time desmanchou-se. Todos eles envelheceram, mas “Paredinha” na defesa e ele no ataque, sempre foram  inesquecíveis lembranças.
Uma tarde o já velho Lili agarrou um colchão de casal cheio de capim membeca e foi atravessar a rua. Sumiu debaixo da incômoda pesada carga.
Não atravessou. O colchão pesava perto de 150 quilogramas e ele de baixo, ainda na fé de sua juventude, foi até o meio da rua e ali perdeu as forças, até que ajoelhou-se e desabou com a carga sobre o calçamento da rua debaixo do imenso colchão.
Ficou quietinho. Não se moveu. Nem gritou. Sua última visão deve ter sido do calçamento onde caiu. Mas lá, muito longe, ainda ficaram suas lembranças.
Não sei se esta é uma história nostálgica ou não, pois afinal quase todas criaturas falecem sobre um colchão e com ele deu-se o inverso. Faleceu sob um colchão. Quem morre no trabalho, lá na minha terra, eles diziam que era um “rola pedra” e ele foi uma destas criatura.
Quem sabe ainda joga no céu aqueles passes rápidos e os dribles infindos? Era assim que ele desejava a eternidade.
J. R. M. Garcia