Posto de combustível na Anhanguera, Limeira. Era
noite.
        Um homem com
celular no ouvido e gritando. 
--Cumé ?! Fala mais arto. Num tô intendeno.
        Andava para cá e
para lá com o celular no ouvido. Sua voz ouvia-se quase a uns cem metros, creio
eu. 
--Mas comcê qui é ? Não tô intendeno....
       Silêncio. Ele
ouve o que estão dizendo-lhe no celular. E, pelos gritos, eu também já estava
curioso mantendo certa distância do cidadão.
--Mas...
        É interrompido.
Volta a gritar no celular após um minuto. 
--Fii duma égua. Ocê bebeu ? Seu....
        Novamente
interrompido. 
        Já éramos dois
interessados no diálogo.
--Fii duma puta...ocê 
deixa chegá na divisa da Bahia prá pedi dispensa ?
        Agora o outro
falava também, mas o de cá não ouvia mais nada, parece-me.
--Ocê é um fiié da puta...Entendeu? Vou pô ocê na cadeia....Canáia...Vagabundo...        
        Toma um fôlego,
olhando a volta como se procurasse algum objeto. O desespero era grande. Fazia
gestos de estar chutando coisas.
--Cê tá loco....Vai deixá u caminhão aí no posto ? Carregado
?
        E recomeçou a
ladainha. 
--Fii de égua, é o qui ocê é. Num pode deixá u caminhão aí,
fi dá puta...Deixá cu dono do posto ?
        Ele suspira,
toma fôlego, parece ouvir. Grita então.
--Não fié de puta...num pode deixá esse caminhão nu posto...num
tem siguro...Eu vô matá ocê...vagabundo...
      Ouviu mais de
trinta segundos em silêncio. Pensei que a crise resolvesse. Mas de repente o
estouro foi enorme. 
--Fii da puta....num vo falá cum ninguém du posto não...vou
matá ocê...cachorro, vagabundo, sem vergonha....
        O desamparo do
que estava no fone celular aqui foi imenso. 
        O outro desligou
o telefone.
        Ele tentava
desesperadamente retornar a ligação. 
        Só dava sinal de
ocupado.
        Furioso disse
ainda em voz alta: “Vo falá com u Gimiro.....” 
      Em cólera insana
entrou quase correndo no carro verde bastante usado, entre um misto de aflição
e total abandono, quase chorando.  Não
via mais nada.
     Logo depois
tomei um café e, também, entrei na Anhanguera.
     Depois de rodar
uns dez minutos vi guardas, luzes, o trafego em meia pista, resgate. Um
acidente na estrada. 
        Olhei. O carro
era o carro verde dele.
         Havia muita gente no local.
J. R. M. Garcia. 
