terça-feira, 15 de julho de 2014

= ORDEM DE PAGAMENTO =



         Sexta feira, dia 11, antes do final da Copa.
       Tomei banho, vesti uma roupinha mais ou menos, passei água de cheiro e desci para o banco. Logo vi a fila desanimadora, mas ainda assim peguei uma senha na coluna dos velhos. O número de funcionários é muito menor do que os necessitados.
       O banco é o Santander. A agência não vou dizer para não comprometer as vítimas, sejam elas funcionários ou contribuintes.
       Uma hora e trinta depois meu número brilhou no placar.
       Fui lá. Estava na fila errada. Deveria ser na de “pessoas físicas” e eu, até que provem ao contrário, sou pessoa física de carne e osso.
       Entrei em uma fila menor. A de mais ou menos uma hora.
       Fui atendido por um cansadíssimo e amável gerente.
--Identidade. Ele pediu.
      Ele olhou, olhou, conferiu meu rosto com a foto, mas assim meio triste reconheceu-me na foto.
--Endereço?
--Não tenho. Sou sem teto.
--Mas onde o senhor mora?
--Na pensão da Dona Tunica.
       Ele voltou-se para mim e viu que eu estava sério.
--Mas que pensão é essa?
       Prontamente respondi.
--Não é uma pensão oficial. Mas dão-me pouso e comida lá. E, aliás, muito boa.
       Ele ficou assim meio que fora de órbita. Levantou-se e foi até outra mesa, donde vi que ambos olhavam-me pelo vidro.
       Voltou.
--E, como o senhor faz para a correspondência?
--Como fazia em Montivideo. Posta restante.
     Aí ele realmente não entendeu nada. Parecia não conhecer este serviço.
       Voltou à mesa do outro. Olharam-me novamente.
       Disse.
--O senhor precisa preencher uma carta.
--Sim. Concordei.     
    Redigiram uma correspondência solicitando ao Banco Santander que me enviasse para a conta tal e tal a importância por mim solicitada. Demoraram demais a chegar a uma conclusão se esta seria via fax ou digitalizada.
       Bem. Mas nesta altura dos fatos já o expediente estava findando.
       E findou.
       Segunda não voltei. Estava com preguiça demais.
       Hoje, terça feira, fui lá.
Vendo-me o dito atendente da vez passada, adiantou-se.
--Todo aquele serviço foi perdido. O senhor não veio na segunda.
--Pensei que guardassem o dinheiro aí.
--Não. Ele veio e voltou e o senhor teve setenta reais de despesas debitados na conta em Ribeirão.
       Reclamei.
--Isso é impossível.
       Ele respondeu prontamente.
--O senhor pode reclamar.
       Eu disse:
--Já reclamei.
       Ele indagou:
--Para quem ?
       Eu finalizei sorrindo.
--Para Deus, ora.
       Em sorrisos começamos a mesma maratona ou via sacra anterior. Daí já me passaram para uma moça, também muito simpática.
       Um detalhe. Durante o expediente da moça, chegou  um senhor idoso, pessoa simples e a agradeceu quase orando:
--Graça a Deus....Tirei u dinhero. Minha oração foi tendida.
       Ao final não consegui retirar meu dinheirio. O expediente findou novamente.
   Amanhã vou tomar banho, passar água de cheiro novamente e vou lá.
       Vamos ver, né?
     Se eu precisasse mesmo deste dinheiro já não estava entre as “pessoas físicas”, não é ?
       Minha fila seria outra.
       Depois eu conto como será amanhã.
       Abraços.
       J. R. M. Garcia.