quinta-feira, 4 de março de 2021

CONTARAM-ME (CRÔNICAS E CONTOS)

           



                                         

            CONTARAM-ME
           Coisa esquisita . 
                             Estavam de pé, no balcão, tomando um café, vestidos de pára-médicos, comendo pão de queijos. Ouvi a conversa e prestei atenção. Não cochichavam, falavam em voz audível.    
---Ela já ia levantar quando assentou de novo na cama. Que "rebu"!!!
queria descer da maca e gritava a plenos pulmões.....           
---De fato. Que "barraca"!!!. Você caiu aquela hora ? 
            ---Caí sim. Escorreguei em uma das pernas e segurei na maca...dei uma dentada no ferro da maca. Machuquei a boca. Mordi o cano.... E ela queria descer. Ficou brava e xingando cada vez mais alto.  
            ---Que vexame...E você firme, segurando os ombros dela ?
            ---Eu nunca a deixaria cair. Podíamos cair, mas os dois. Ela não. Isso seria o cúmulo do cúmulo......Pediria a demissão de enfermeiro na hora. 
            Eles rindo a pregas soltas. Gargalhavam e comiam com a boca mais  boa os pães de queijo. 
            Resolvi puxar assunto. 
            ---Com licença. Sem desejar, ouvi o rolo. Afinal, ela saiu da sala ou não ? 
            ---Saiu sim. Chorando mas saiu. 
            ---Por quê chorando  ? 
            ---Sabe !!! Algumas pessoas são assim mesmo. Quando saem e veem que vão  ter alta ficam triste e até choram...Eu penso que são pessoas que choram da tristeza de voltarem a sua vida usual, cheia de dificuldades, sem nenhum meio de viverem uma vida no mínimo com alguma decência. Imagino mesmo, que o mínimo de carinho que tenham tido na vida, são aquelas horas que passaram na UTI.  Mesmo as portas da morte ainda preferem um tratamento de carinho e de desvelos do que a vida miserável que vivem que vivem na miséria.
            "---Muito triste isso"....fiquei pensando.
             Rápido concluiu o para-médico:
             ---Não fique triste amigo. Para sempre ela sentirá este minuto de carinho que tivemos com ela em toda vida. Sua miséria terá um refugio no abrigo de nossos corações que, mesmo as portas da morte, ainda lhe demos.
Levantei o braço e dizendo-lhe:
            ---Por favor... dê-me a despesas dos dois rapazes.  
            Com semblante triste paguei suas pequeninas despesas com os pães de queijo.
            ---Até mais ver amigos.......

J. R. M. GARCIA.